sábado, 25 de agosto de 2007

Exorcista de Portugal


Arquivo: Edição de 22-01-2004

Região

MURÇA

Exorcista de Portugal

Desde o mês de Setembro de 2003, altura em que o Lamego Hoje o deu a conhecer, o padre católico Humberto Gama realizou 1.012 exorcismos, de Norte a Sul de Portugal, visitando as pessoas em suas casas ou recebendo-as na sua casa, na aldeia do Cadaval, Murça, onde, na maioria dos dias, se chegam a juntar 15 viaturas, com famílias, esperando horas a fio pela sua vez de serem atendidos.
Em dois cadernos de apontamentos, diferentes, o sacerdote regista as pessoas que atende, o trabalho realizado e o diagnóstico a seguir. Num outro caderno estão catalogadas as mais de 3.500 pessoas que o contactaram telefonicamente e que ainda não tiveram oportunidade de serem atendidas.
De entre as pessoas que o contactaram o exorcista registou uma dúzia de casos de possessão e cerca de 500 situações de incorporações. A restantes pessoas sofriam de esquizofrenia, alucinações e casos de saúde que precisam mais de um clínico geral do que do um exorcista. “Encaminho-os para lá porque disso eu não entendo nada”.
Quando dedica uma semana para a área da grande Lisboa, o sacerdote contacta todas as pessoas daquela região que o solicitaram e trabalho intensamente (“infelizmente o dia só tem 24 horas”) para não deixar ninguém por atender, situação que se estende ao Algarve e Coimbra. Na zona norte as pessoas são atendidas na sua casa, no Cadaval, Murça.
Para Humberto Gama “o exorcismo é uma vocação e paixão. Já me aconteceu ter três famílias a dormir na mesma noite, na minha casa, porque sabia que depois de começar o trabalho num dia, este só iria terminar no dia seguinte. Quando o exorcismo demorar três horas é mesmo esse tempo que tem de passar com a pessoa. Depois é preciso aguardar pelas reacções para ter a certeza de que o espirito não volta”.
Segundo o sacerdote, “quando me meti nisto, já há muitos anos, pensava que o exorcismo era uma ciência fácil, tipo psiquiatria e psicologia. Afinal, hoje constato, estamos num mundo onde não há limites e cada caso é um caso, sendo que uns são mais complicados que os outros. Hoje ao tocar numa pessoa eu posso dizer se é um espirito vivo, ou um espirito morto, que está incorporado nela”.

Espirito vivo:
O Espirito vivo é sempre inveja, praga ou feitiço que nos fizeram. Quando eu tiro esse espirito da pessoa ele diz logo: ‘eu vou mas volto’. Mas, no fundo, não é o espirito que volta. É a pessoa a quem o tiramos que tem o poder de incorporar. Se não for bem tratada (defumada e com orações) quando passar pelo espírito ele volta a incorporar.
Espirito morto:
O espirito morto pode ser mais difícil de tirar, mas quando se tira ele despede-se. Normalmente esse espirito é de alguém que já morreu, que tem uma possessão do corpo, há muito tempo, e para os desalojar muitas vezes é complicado. Este é o tipo de espírito que, quando está na iminência de ser desalojado, pergunta sempre: ‘então para onde é que eu vou agora?’. A grande realidade é que não temos resposta para lhe dar. Mas quando vai não volta para aquele corpo.

Campo de acção do espirito:
“O campo linear de superfície por onde um espirito vagueia é sempre um cemitério, uma igreja, festas religiosas, locais onde ele encontra muitas pessoas e procura para se incorporar um ser humano que esteja mais fragilizado emocionalmente.
Depois, se não for desalojado, o espírito acompanha aquela pessoa até a altura em que ela for a enterrar no cemitério. Mesmo depois de morto, quando os familiares ainda estão a rezar pelo defunto, o espírito ainda lá está. Só quando o caixão desce à terra, no cemitério, e lhe começa a cair a terra em cima, ele apercebe-se que aquele corpo vai apodrecer e então larga-o. Mas logo no cemitério, entre os acompanhantes do falecido, ele procura alvo para se incorporar”.

Exorcismo:
Segundo a igreja, quando se realiza o exorcismo, devem estar apenas presentes o padre e o paciente. Segundo Humberto Gama “muitas vezes aparecem-me pessoas da família, atrevidas, (mães, avós, e outros familiares) que querem assistir, eu coloco-os de sobreaviso de que se sujeitam a ouvir o que não desejam. Depois ouvem o espirito diz à pessoa possessa: ‘não tenhas vergonha porque a tua mãe ainda é mais prostituta do que tu. Ela tem um caso com ‘fulano’ sem o teu pai saber, e o teu irmão mais novo nem é filho dele, porque foi feito quando ele estava em França; e coisas do género. Depois disto, normalmente, as pessoas vão saindo da sala uma a uma, algumas com medo do que vêem e outras com vergonha. Com o espírito não se brinca. Estas são questões demasiado sérias e que requerem rigor e verdade”.
O exorcismo de uma idosa, residente no Douro, trazida até Humberto Gama por um médico cirurgião do Porto, “que me disse: ‘a minha irmã está maluca. Há 17 anos que passa a vida telefonar-me a dizer-me que tem um grilo na cabeça, já foi a todos os curandeiros e ninguém lhe resolveu o problema’.
“Quando comecei a ver a senhora, com 65 anos, a determinada altura foram precisas oito pessoas (de entre as quais o irmão) para a segurar. Cuspiu-me, escarrou-me, esbofeteou-me e tudo o mais que conseguiu fazer. Quando começou a falar, o espírito incorporado era um irmão, colocou em cheque a vida do irmão, prometendo que se pudesse o mataria e que a ela lhe faria todo o mal possível”.
“O médico que a tinha trazido, quando ouviu aquela voz começou a chorar, foi pedir desculpa à irmã por nunca ter acreditado nela quando esta lhe dizia do mal que padecia e de nunca a ter compreendido, porque ele tinha passado o último Natal em casa dela e não tinha conseguido dormir com um grilo que cantou na casa durante as três noites. Associou que, realmente, a irmã tinha razão. Até eu próprio fiquei chocado com o que deparei e do trabalho que tive para limpar o espirito daquela senhora”.
Como curiosidade refira-se que, no passado sábado, o Lamego Hoje constatou que o sacerdote atendeu na sua residência nove famílias de: Praia de Mira, Vila Real, Balsa-Alijó, Castelo Branco, Lisboa (duas famílias), Braga, Ermesinde, e Celorico da Beira.
Luís C. Ribeiro